quinta-feira, 24 de março de 2011

Uma ideia irrazoável (?) mas pertinente.


Para Eric Cantona, «é muito simples fazer a revolução hoje». Sem sangue, sem armas: cada cidadão vai ao banco e levanta o seu dinheiro, explica o ex-futebolista, chamado de 'Robin dos Bancos' pela imprensa francesa.

«O sistema é o quê? O sistema gira em torno dos bancos. É alicerçado no poder dos bancos. Por isso tem que ser destruído a partir dos bancos», afirmou Cantona numa entrevista em Nantes, no início de Outubro.

«Não creio que se possa ser completamente feliz ao ver a miséria à nossa volta, a não ser que se viva num casulo. Mas há uma possibilidade, algo a fazer», afirmou também o ex-futebolista nessa entrevista, confessando uma «irritação» com os milhões de compatriotas que, em França, durante semanas, protestaram com manifestações e greves contra o novo regime de reformas.

«Hoje em dia, estar na rua significa o quê? Hoje, já não é assim [que se faz]. Não começamos a pegar nas armas, a matar as pessoas, a fazer a revolução. É muito simples fazer a revolução hoje», explicou Cantona.

Se «os três milhões de pessoas que estão na rua com os cartazes, forem ao banco e levantarem o dinheiro deles, os bancos desabam. Três milhões ou dez milhões.». O impacto é seguro. «E, nesse caso, vamos ser ouvidos de outra maneira», antecipou.

O ex-futebolista e treinador de futebol de praia, agora também actor com sucesso nos palcos franceses, foi ouvido por um colectivo franco-belga, que criou uma página na rede social Facebook e abriu depois uma página na Internet, no endereço www.bankrun2010.com, em sete línguas, incluindo português (do Brasil).

«Revolução! No dia 7 de Dezembro vamos levantar o nosso dinheiro dos bancos!», apela o site e mais de 58 mil pessoas uniram-se ao apelo, afirmando que irão levantar as suas economias na terça-feira. Ou, pelo menos, que pensarão um pouco nisso.

A generalidade dos comentadores na imprensa francesa considera a ideia de Cantona inócua em termos de resultados. No entanto, salientam a força «filosófica» e «política» da ideia, que surge num momento de turbulência social em França, onde a mobilização contra o novo regime de aposentações deixou um lastro de indignação e um ar de raiva colectiva no ar.

Uma sondagem publicada a 2 de Dezembro por uma revista de ciências sociais dava conta de que mais de metade dos franceses (53 por cento) se sente ainda «furioso» contra o regime de reformas, aprovado em Outubro pelo Parlamento.

É neste clima tenso que «a iniciativa de Cantona encontra um eco seguro junto dos cidadãos aterrorizados com os planos de austeridade que se estendem pela Europa com o argumento de que é preciso tranquilizar os mercados financeiros e salvar os bancos», referiu a associação altermundialista Attac.

Também Bernard Thibault, líder da Confederação Geral de Trabalhadores, principal rosto dos dois meses de protestos contra o regime de reformas, constata que «hoje não há resposta à altura da exasperação e do descontentamento social que existe nas empresas».

Muitos intelectuais e sindicalistas tinham avisado que a contestação social ia tomar outras formas. «Muitos são os que pretendem agir aqui e agora para mostrar aos governantes que recusam as suas políticas irresponsáveis», declarou também a Attac.

Cantona já ganhou esta partida. A sua ideia pode ser irrazoável mas é pertinente, como resumia na edição de sábado o editorialista do diário Libération.

Lusa / SOL

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